A quem interessa a Greve


Arnaldo Niskier

Como quase todos os brasileiros, fiquei perplexo com a manifestação de um grupo de professores municipais e estaduais do Rio de Janeiro diante do ônibus colorido que conduziria os jogadores para a serra de Teresópolis, onde iniciaram o treinamento para a Copa do Mundo. Portando um cartaz com os dizeres 
“Não vai ter Copa, vai ter greve”, como se fosse possível essa opção, panfletaram o ônibus, colando dezenas de adesivos e tentaram colocar uma faixa, logo retirada pelos seguranças. Como se não bastasse a sucessiva paralisação das ruas que cercam o Palácio Guanabara, além da histórica Avenida Rio Branco, tivemos esse triste espetáculo, que nada tinha a ver com as justas reivindicações do magistério. Como alguém disse, uma questão de foco. Cada coisa no seu lugar.
 
 Tenho uma relativa experiência de lidar com greves de professores. Ao tomar posse, na Secretaria de Estado de Educação e Cultura, em março de 1979, todo o sistema estava parado, aliás, desde a gestão da minha antecessora. Procurei o diálogo e fui exaustivo, nas reuniões com os líderes do movimento. Recebi 
até um elogio de Tancredo Neves, num encontro no centro da cidade: “Parabéns 
pela sua conduta. Nada de jogar pedra ou água em professores. Lá em Minas um 
governador fez isso e até hoje, quando passa na frente de um grupo escolar, a mãezinha dele é muito lembrada.”
 
 
Louve-se a conduta sábia e experiente do governador Chagas Freitas. Lá pelas tantas, chamou-me ao Palácio e diante da lista de pleitos, que lhe mostrei, citou uma frase que se tornaria clássica: “Qual de nós não deve a vida a uma 
professora?” Mandou chamar o Secretário do Planejamento, Francisco de Melo Franco, que tinha a chave do orçamento, e mandou atender a tudo. Deu aumentos de até 1.000% para a categoria V, a mais sofrida de todas, tornando o Rio, por hora-aula, o Estado que melhor pagava aos professores.
 
 Quando chegou o mês de agosto do mesmo ano, uma surpresa: os líderes do movimento, os mesmos, resolveram reencetar a greve. Não havia mais o que ceder, mas mesmo assim propuseram a greve, já então por uma motivação simplesmente política. “Para ficar no noticiário”, como me disse um deles. Foram os 
meus piores momentos como Secretário de Estado. Temia por alguma agressão ou por alguém se fazendo de vítima, para culpar o Governo. Felizmente, nada disso aconteceu, mas ficou a mágoa pelos prejuízos causados aos alunos, vítimas inocentes disso tudo.
 
 Agora, parece que é a mesma coisa. E o pobre do aluno? 
Não se vê em nenhuma faixa qualquer menção ao aperfeiçoamento do processo ensino-aprendizagem, nem à melhoria das condições de atendimento aos alunos. De novo, a greve política, ainda mais num ano eleitoral. Talvez isso explique porque os líderes grevistas tenham desistido da simpática mediação do Ministro Luís Fux, do Supremo Tribunal Federal. Só há uma coisa a ser esclarecida: o povo não é bobo e percebe direitinho quando o movimento é feito de maneira desfocada.