Um barco de cultura


Arnaldo Niskier

O contratorpedeiro Bauru, nascido nos Estados Unidos, tem uma história muito bonita. Esteve na II Guerra Mundial e foi cedido ao Brasil, para operar como navio-escolta. Já se chamou U-28 e hoje é um navio-museu, ancorado permanentemente no parque olímpico do Rio de Janeiro, servindo de inspiração aos milhares de estudantes que o visitam diariamente. É um autêntico barco de cultura, embora mantenha os seus armamentos originais.

A convite do Vice-Almirante José Carlos Mathias, diretor de Patrimônio Histórico e Documentação da Marinha do Brasil, estivemos em visita ao navio-museu, matando saudades dos velhos tempos em que fizemos o serviço militar e viajamos durante 15 dias por mares de Salvador, Recife e Abrolhos. Foram horas extremamente agradáveis, de que também participou o Almirante de esquadra Alfredo Karam, ministro da Marinha do governo João Figueiredo. Aos 94 anos, inteiramente lúcido, contou histórias de sua juventude na Tijuca e no América F.C., cujas cores defendeu como jogador infantil, embora no fundo jamais tenha deixado de ser um torcedor fanático do Flamengo...

Nosso estágio foi em julho de 1956, depois de dois anos de aulas no CIORM, na Ilha das Enxadas. Como dissemos certa vez, “foi um aprendizado sobretudo de disciplina e amor ao Brasil, de que jamais esqueceremos.” Na viagem navegamos 122 mil milhas e tivemos quase 10 dias de mar. Tudo verdadeiramente inesquecível.

O “Bauru” (homenagem ao rio que dá nome a essa cidade paulista) foi o quarto navio de uma série de oito transferidos dos EUA para o Brasil, no esforço de guerra. É um dos contratorpedeiros que se tornaram a espinha dorsal da nossa esquadra. Tinha duas missões: operações de caça anti-submarino, escolta e comboios e apoio ao serviço aéreo de evacuação das tropas aliadas. Após o fim da II Guerra Mundial, foi incorporado à Segunda Flotilha de Contratorpedeiros, depois transferido para o Esquadrão de Avisos Oceânicos. Após 37 anos, teve um nobre e permanente destino: tornou-se o primeiro navio-museu da Marinha do Brasil, ao lado do antigo submarino Riachuelo. Ambos se encontram hoje em pleno uso, no jardim olímpico do centro da cidade, visitados por interessados estudantes de escolas públicas e particulares.

Aproveitamos o ensejo da visita para uma proveitosa conversa com alguns estudantes. Eles estão empolgados pelo ensino técnico, o que é extremamente saudável. O naipe feminino tem preferência pela enfermagem, onde a Marinha oferece oportunidades concretas em suas unidades. Tivemos a curiosidade de perguntar pelo magistério. Fez-se um expressivo silêncio, quebrado apenas por um professor, com essas palavras: “Não há nenhum interesse pela carreira. Ela está socialmente desprestigiada e não oferece bons salários.” Não há como aceitar passivamente essa triste realidade, na verdade sinal dos tempos.