O sucesso da Fliporto
Arnaldo Niskier
Mais uma vez – e ainda em Olinda - realizou-se a Feira do Livro de Pernambuco, popularizada com o nome de Fliporto, para alegria do seu organizador, o escritor Antonio Campos.
Um dos pontos altos do evento foi o bate-papo entre dois grandes conhecedores da obra de Gilberto Freyre (Casa Grande e Senzala): Marcos Vilaça e José Paulo Cavalcanti. Foram referidas as amizades de Gilberto com personalidades como Mauro Motta, Oliveira Lima e Manuel Bandeira. Episódios de muita graça vieram à tona, inclusive a quase desconhecida paixão de Gilberto por futebol. Era torcedor do Sport Club do Recife e fã de um famoso licor de pitanga.
Diante de um enorme público, presente na sala principal da Fliporto, abordou-se a reconhecida vaidade de Gilberto e a reação de intelectuais paulistas à sua competência literária. Pura inveja. Lutava para defender os seus amigos.
Antes, no mesmo palco, falou o escritor Frei Beto, que contou curiosas passagens do seu convívio com Fidel Castro e a sua intermediação junto aos bispos católicos de Havana para atenuar a reação da Igreja ao novo regime. Chegou a enviar 1.000 bíblias em espanhol para Cuba. Foram totalmente consumidas pela população, numa prova eloquente de fervor religioso.
Na Casa Brasil, falei sobre o encontro que tive com Gilberto Freyre, no Instituto Joaquim Nabuco. O tema era a “pedagogia dos trópicos” e desenvolvi com tranquilidade, até que faltou luz no auditório. Não era possível continuar. Ele, então, me chamou para a sua sala, onde ainda havia a luz do entardecer no Recife, e ficamos uma boa meia hora conversando. Não consegui convencê-lo a aceitar sua candidatura à Academia Brasileira de Letras. Dizia que não queria pedir votos a ninguém, e nem vestir aquele fardão.
Com a volta da luz, pude completar a minha conferência, abordando o regionalismo, na obra de Gilberto Freyre. Também a defesa que fazia do valor da língua portuguesa, que ele queria cada vez mais respeitada. Não apreciava a mania brasileira de copiar as coisas do estrangeiro, caracterizando o que ele chamava, desdenhando, de transplantação de cultura. Devíamos agir em defesa das nossas perspectivas socioculturais.
Foram muitas as atrações da Fliporto, como o debate sobre política internacional entre os escritores Sílio Boccanera e Geneton Moraes, com a abordagem do que se convencionou chamar de “primavera árabe”. Na Casa Brasil, patrocinada pelo JB, a pintora Christina Oiticica, esposa de Paulo Coelho, explicou todo o seu processo de criação, que inclui uma temporada dos quadros sob a terra, como aconteceu em diversos sítios internacionais, a partir de Santiago de Compostela. Depois da sua exposição, foi lançado o livro “Contando a arte de Christina Oiticica”, escrito por Patrícia Luna, também presente ao evento.
Vale registrar que a Fliporto repetiu o sucesso dos sete anos anteriores, recebendo desta feita, em Olinda, cerca de 75 mil pessoas.