Qualidade em xeque


Arnaldo Niskier

Com o título acima, o jornalista e acadêmico Merval  Pereira escreveu em o Globo de 18/9  um artigo polêmico sobre os resultados do último Enem.  Apesar das informações em contrário, ele duvida dos chamados “bons resultados”, a partir da premissa de que estamos mal no concerto internacional e de que houve uma queda sensível na qualidade da performance das escolas públicas.

 Só para se ter uma ideia: 23900 escolas prestigiaram o exame feito pelo Inep,  que nos trouxe a convicção de que 1500 delas, ou seja, 6% desse total podem ser consideradas em boas condições de formar recursos humanos adequados  à sociedade do conhecimento.

 Convenhamos, é muito pouco para comemorar.  Querem um exemplo concreto? Na prova do Pisa, que avaliou a capacidade de leitura dos jovens de 15 anos, o Brasil ficou em 53º lugar (entre 65 países).  Em matemática e ciências, os resultados foram ainda piores.  Não se pode pensar em educação apenas olhando para o próprio umbigo.  É preciso comparar com os demais países.
 
 Voltando ao Merval Pereira, no seu corajoso artigo, fizemos de início a defesa da avaliação como processo: “Vivemos 500 anos sem avaliar coisa alguma.  Agora, aliás, há uma overdose de avaliações, mas é inequívoco que, em qualquer uma delas, o Colégio de São Bento será sempre o primeiro colocado porque tem um elogiável projeto pedagógico, do qual não se afasta, e que teve na sua origem a competência e a dedicação de D. Lourenço de Almeida Prado.”  Em que se baseia a escola carioca?  Numa disciplina beneditina, a que são submetidos todos os seus alunos e professores, além de um notável equilíbrio entre a educação humanística e a científica.  Sobre isso, iremos nos deter numa próxima oportunidade.
 
 Tocamos num ponto essencial: “Nossos professores, em sua grande maioria, são muito mal remunerados e mal formados.  A formação contínua, de que tanto se fala, é apenas uma lenda.  Se o professor não se atualiza, o aluno perde o respeito por ele.  Isso é bem  mais evidente na escola pública.”
 
Outra questão é o número de horas na escola. A média pública é de quatro horas, das quais se sabe que somente 2h20 são mesmo destinadas à aprendizagem.  Perde-se um tempo enorme com chamadas e problemas de disciplina, cada vez mais frequentes, gerando inclusive violência.  Alunos e professores não podem trocar insultos, nem agressões físicas, como se tem observado.  Aí convém lembrar o que ocorre nos países primeiros colocados, no ranking internacional, onde invariavelmente estão as nações escandinavas.  O respeito  aos mestres começa com a educação trazida de casa.  Aqui isso tem sido descurado.
 
O Brasil não pode dormir tranquilo com a educação oferecida às crianças e jovens.  Estamos sendo competitivos em matéria  econômica, mas esse processo poderá ser sacrificado, em pouco tempo, se não houver uma reação qualificada na formação de recursos humanos.  A tragédia do ensino médio começa muito antes, desde  a  descurada  educação infantil.  Só a universalização do ensino fundamental não é suficiente para a reação necessária.