A valorização do ensino médio


Arnaldo Niskier

 

A leitura do livro do educador paraibano Itapuan Bôtto Targino, “100 Anos do Ensino Industrial Brasileiro”, mostra a necessidade de repensar a profissionalização no nosso país, através dos seus fundamentos.
 
Em 1818, com a criação do Corpo de Artífices, que ocupou o Seminário de S. Joaquim, D. João VI mandava recrutar, para aprendizagem de ofícios, “todos os rapazes de boa educação que quiserem nele entrar.” Infelizmente, assim não aconteceu, pois o ensino profissionalizante passou a caracterizar-se como ensino para infelizes, desamparados e deserdados da sorte. No ano seguinte foi criado, na Bahia, o Seminário dos Órfãos, que preparava aqueles sob a tutela do Estado, dando-lhes uma carta de ofício em diferentes modalidades.
 
Este foi o grande estigma que marcou o ensino profissionalizante brasileiro, inclusive realçado por Celso Sucow da Fonseca, quando se pronunciou a respeito: “Já se não vai mais falar em todos os rapazes de educação que quiserem nele entrar, mas nos desfavorecidos pela fortuna, nos deserdados da sorte.”
 
O tempo não mudou a filosofia implantada à época. Em 1822, com a Independência, ao invés de surgir uma nova fase para esse tipo de ensino, houve, sim, uma interrupção no processo. 
Pedro II, um intelectual sempre dedicado às causas da educação, em 1854, tornou a se preocupar com o ensino profissionalizante. Mais uma vez, foi mantido o velho preconceito, e o caráter de inferioridade permaneceu. Foram criados o Instituto dos Meninos Cegos, hoje Instituto Benjamin Constant e o Instituto dos Surdos Mudos (1856).
 
Grandes nomes como Ruy Barbosa, Tarquínio de Souza, autor do livro “O Ensino Técnico no Brasil” (1886) e Joaquim Nabuco defenderam o ensino profissional, sendo que este último afirmava, em artigo publicado, no jornal O País (1887): “A atual educação incute no próprio filho do operário desprezo pela profissão do pai, pela classe a que ele pertence. Uma sociedade onde os filhos têm vergonha do ofício decente, graças ao qual o pai pôde educá-los, precisa de alguma reforma social.”
 
Com o Presidente Nilo Peçanha, no começo do século XX, o ensino técnico-profissional foi destinado a crianças desvalidas, o que marcou profundamente as suas características. 
Esse estigma prevaleceu na Emenda Constitucional de 1937, quando se afirmou que “o ensino técnico-profissional será destinado às classes menos favorecidas.” Só a partir da segunda metade do século passado é que houve mudança de orientação. O ensino técnico passou a ser considerado como essencial, no quadro das ofertas democráticas de educação.
É, pois, com esperança que assistimos ao atual empenho do presidente Lula em valorizar o ensino técnico, criando um grande número de escolas especializadas.