Carta ao Presidente - EDUCAÇÃO


Arnaldo Niskier

Nunca os problemas da educação mereceram tão amplo debate. Atingir qualidade de ensino não é uma tarefa fácil. É preciso mudança de pensamento político. Educação como prioridade significa ampliar o investimento de forma contínua. A educação é o meio pelo qual a sociedade transmite seus princípios e valores. É reforçando a educação que estaremos potencializando o conhecimento do mundo, tornando-nos capazes de melhorá-lo. 
 
Desde 2013, as escolas públicas brasileiras seguem o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (Pnaic), uma iniciativa para estimular que as crianças estejam plenamente alfabetizadas aos 8 anos, no 3º ano do fundamental. Mesmo assim, não é isso o que acontece na realidade. Dados da Avaliação Nacional de Alfabetização (ANA) de 2014 mostraram que um quinto dos alunos da rede pública chegou ao 4º ano do fundamental sem aprender a ler adequadamente. Os números são alarmantes: temos 14 milhões de analfabetos no país.
Há necessidade de mais recursos para o financiamento da educação, que tem o terceiro orçamento da República, atrás somente de Saúde e Defesa. Deveríamos chegar a destinar entre 8 a 10% do PIB, para que todos os planos e projetos fossem viabilizados, no prazo determinado, sendo possível vencer um dos maiores obstáculos da educação brasileira que é a remuneração do quadro do magistério. Temos cerca de 3 milhões de professores empregados (quase 500 mil no ensino superior), com a média salarial de 500 dólares, o que é muito pouco.
 
Devemos valorizar a atuação dos professores e especialistas, não só aperfeiçoando os seus cursos de formação (providência urgente), como remunerando adequadamente esse serviço fundamental para os planos de crescimento do país. Será sempre difícil estimular os jovens da classe média a escolher o magistério com salários que são reconhecidamente dos mais baixos do mundo. A estimativa é de que, nos próximos 5/6 anos, possamos triplicar os números atuais. E, ainda assim, estaremos abaixo de nações como as que foram batizadas de “tigres asiáticos”.
Enquanto os chamados países ricos investem anualmente US$8.857,00 por aluno, nos diversos níveis de ensino, o Brasil destina apenas US$2.000,00, ou seja: menos de 25%. Esse é o quadro apresentado pelo relatório “Um Olhar sobre a Educação”, da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), que representa as 30 nações mais ricas do mundo, além de um grupo de associados que inclui Brasil, Alemanha, Austrália, Canadá, Coreia do Sul, Espanha, Estados Unidos e França.
 
Pensa-se pouco no conteúdo da educação, sendo comum jovens chegarem ao diploma sem os mínimos conhecimentos básicos, especialmente em Literatura, Matemática, Ciências, sem nos aprofundarmos na tragédia que representa, pelos seus resultados, o desconforto com que é tratada a Língua Portuguesa.
 
 Um dos temas discutidos na última reunião da Academia Brasileira de Educação, sob a presidência do professor Carlos Alberto Serpa de Oliveira, foi  a implantação do  ensino domiciliar  no sistema brasileiro de educação. A conclusão dos acadêmicos é que se trata de um verdadeiro equívoco, que deve ser evitado, embora já existam 15 mil alunos comprometidos com esse sistema. Mas temos 48 milhões de estudantes de 4 a 17 anos nas escolas do nosso país.
 
Em pesquisa do Datafolha, conclui-se que 8 em cada 10 brasileiros demonstram rejeição ao ensino domiciliar. O curioso é que o governo federal insiste na ideia, embora se saiba que o ensino de Matemática seja dado de forma equivocada e sem respeito às individualidades dos alunos. Mas grupos religiosos e conservadores insistem no ensino domiciliar e é por isso que o MEC defendeu a iniciativa junto ao Congresso Nacional. Não considerou que esteja havendo rejeição ao tema.
 
Mesmo que se respeite a ideia de que é um direito dos pais escolher o tipo de educação a ser ministrado aos filhos, na busca da formação integral de crianças e adolescentes, elas precisam sem dúvida da convivência para alcançar outras visões, para além do ambiente simplesmente familiar. Esse modelo hoje é defendido por uma parcela mínima da população.
 
É certo que a escola ensina, mas é a família que educa. É indefensável a inversão dos papéis e responsabilidades nesse processo. Concordamos que há muitos erros na educação tradicional, que sofre também pela ausência de materiais essenciais. Nas escolas hoje existentes as bibliotecas são precárias (faltam livros fundamentais) e os laboratórios não têm todos os recursos necessários, como se pode depreender quando o tema é a indispensável internet. A tecnologia  avança(estamos chegando ao 5G) e sabe-se que o atraso, na escola pública brasileira, é monumental. Nem por isso se pode garantir que essas falhas possam ser corrigidas, em curto prazo, com a transparência dessas responsabilidades para os pais aflitos. O pior de tudo é o cheiro de politicagem, nas medidas que estão sendo tomadas. É injustificável.
 
Ações estruturantes requerem política e gestão do Ministério da Educação com foco na universalização e qualidade do ensino básico e na expansão com qualidade do ensino superior. Esse binômio é essencial para o Brasil crescer como nação desenvolvida e se destacar no cenário competitivo internacional, de forma soberana em defesa dos interesses nacionais e como agenda da construção de um mundo melhor para todos.