O livro foi a maior atração
Arnaldo Niskier
A primeira e decisiva impressão que ficou, no espírito do visitante, ao chegar ao concorrido Armazem nº 4 do Cais do Porto (Pier Mauá), foi a imensa fila dos jovens, com papeletas de “vale um livro”, esperando a vez no stand “Mais Livros”, da Imprensa Oficial do Estado do Rio de Janeiro. Era a “Semana de Arte”, uma bela iniciativa do Secretário de Educação Wilson Risolia, para despertar o interesse dos jovens da rede pública para os atrativos da educação artística.
Não eram só livros, de boa qualidade, trocados pelos vales distribuídos gratuitamente pela Secretaria de Estado de Educação, mas uma variedade de atrações que tornava difícil a escolha. Bandas escolares, poetas de todos os matizes, cantores de música popular brasileira, artistas de circo e de teatro, um festival de quatro dias de duração, contando sempre com imenso público. Não faltou nem uma banda sinfônica, prova de que a garotada gosta do que é bom.
Ao lado de todas essas atrações artísticas, um espaço determinado para o cinema e a literatura, com debates animadíssimos. Imortais da Academia Brasileira de Letras se encarregaram de dar vida ao escritor José Cândido Carvalho, com o seu clássico “O Coronel e o Lobisomem”.
Quem assistiu a todos os debates, sentiu a presença incentivadora dos mestres de língua portuguesa, não os que falaram, mas os que chegaram com os seus alunos, principalmente do interior fluminense, animando-os à integração, estimulando perguntas que eram respondidas pelos acadêmicos, com a premiação de livros editados pela ABL, entre os quais fez muito sucesso uma edição fac-similar de Camões.
Para mostrar a importância dos escritores regionalistas na literatura brasileira, de que Guimarães Rosa e José Cândido são expoentes, foram mostradas algumas expressões utilizadas pelo escritor campista, de forma original, como “largando as quenturas dos agasalho”, “continuei as charutadas de porta de café”, “parecia ter formiga no assento”, “ele era dado a fazer macaquices com a boca”, “o bexigoso abiu a gaveta”, “Seabra, percebendo o meu todo bonançoso”, “falei nesse tom educativo” etc.
Eram neologismos para a época (o livro foi lançado em 1964) e dele existem até hoje cerca de 60 edições, prova eloquente da sua grande aceitação, a partir da primeira edição lançada pela tradicional Livraria José Olympio. Rachel de Queiroz, que também pode ser citada entre os grandes escritores brasileiros regionalistas (a partir do seu “O Quinze”), contou-nos que havia em torno de Zé Cândido, como era carinhosamente chamado, uma particularidade bem interessante. Como morava em Niterói, mas trabalhava no Rio(foi diretor da Rádio Roquete Pinto e presidente da Funarte), sobrava pouco tempo para ele se dedicar às atividades literárias, embora gostasse muito. Tinha um bom emprego na revista “O Cruzeiro”, onde elaborou originalíssimas biografias de personalidades, e para fazer o seu “O Coronel e o Lobisomem” só restou a alternativa de escrever no horário do almoço, quando alimentava a sua inspiração. Dizem que por isso ele era magro.