Somos um país de Misturas
Arnaldo Niskier
Desafiado pelo ex-ministro Ernane Galvêas, aceitei a ideia de discutir os grandes problemas da educação brasileira no Conselho Técnico da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo. Composto por uma plêiade de profissionais bem sucedidos em suas respectivas áreas de atuação, foi um debate extremamente proveitoso, uma espécie de radiografia das nossas maiores dificuldades no campo da educação, às vésperas de um pleito presidencial.
Primeiro, ficou bem claro no espírito de todos que temos hoje um Plano Nacional de Educação, que começou com três anos de atraso (seguindo um velho hábito), mas que falta uma Política Nacional de Educação, desconhecida de todos os que estão envolvidos no importante problema. Não se afirma
com clareza o que desejamos de cada nível de ensino, nem de como se pode qualificar melhor os nossos professores e especialistas, nem de como seria possível, repetindo o que fazem os países desenvolvidos, oferecer tempo integral em nossas mais de 200 mil escolas. Laboratórios nas instituições é um luxo reservado a poucas delas e o emprego do computador se faz de modo enviesado. Explico: as máquinas são compradas pelo poder público, levadas às escolas, mas são primacialmente utilizadas para práticas burocráticas, como acompanhar a frequência e as notas dos alunos. Só 6% delas são empregadas para auxiliar os professores na difícil tarefa de ensinar melhor os conteúdos curriculares, de resto, envelhecidos com o tempo.
Outra questão citada com veemência foi a da falta de bibliotecas devidamente apetrechadas. Aliás, 15 milhões de estudantes da educação básica não conhecem qualquer tipo de biblioteca, o que dá bem a dimensão da indigência dos nossos equipamentos. Como construir, assim, uma educação de qualidade? É certo que recursos deverão com o tempo ser suficientes para enfrentar essa verdadeira batalha. A previsão de alcançar até o fim do PNE o emprego de 10% do PIB, com a bem-
vinda aplicação dos recursos do pré-sal, constitui um fator positivo, mas se não houver competência na gestão escolar, o que se pode esperar? Milagres?
No momento dos debates, surgiram considerações bastante interessantes, a partir do ex-ministro Célio Borja: “Não temos uma cultura homogênea. Somos um país de misturas. O maior desafio é dar atenção às grandes massas.” Depois de criticar a formação dos professores (“que não ensinam os nossos jovens a pensar”), Célio Borja cedeu a vez ao conselheiro José Arthur Rios: “Vivemos a
superstição do computador, mas ele sozinho não resolve nada. Temos uma educação cartorária, burocrática. Desconfia-se ( o que não faz sentido) da iniciativa privada e importamos inovações de outros países. Deveríamos ter uma educação ecumênica, sem preconceitos.”
O ex-reitor Antonio Celso Pereira criticou a forma de constituição do Plano Nacional de Educação: “Metas significam a exteriorização dos nossos fracassos. Seria interessante estudar de forma adequada o projeto de federalização da nossa educação, pois é sabido que estados e municípios fracassaram completamente em suas missões.” Criticou também o corporativismo das escolas superiores federais e pediu uma ampla revisão dos cursos de Pedagogia. Elogiou o Pronatec, que considerou uma pequena luz em nosso ensino médio e mostrou que precisamos hoje de 90 mil
engenheiros e só formamos 1/3 desse total. Por fim, mostrou como a existência majoritária de empregos menos qualificados trava a expansão do PIB.
Falaram ainda o prof. Arno Wehling, o embaixador Marcos Azambuja(“nada melhora, tudo piora um pouco”), a escritora Mary del Priore e o economista Ney Prado, além de Ernane Galvêas, todos com preciosas sugestões para o aperfeiçoamento da educação brasileira. Não custa sonhar.