Um escritor Amazônico
Arnaldo Niskier
Em boa hora, a União Brasileira de Escritores (UBE) resolveu prestar homenagem à memória de um dos seus dedicados ex-presidentes. Foi uma simpática oportunidade para realçar as qualidades pessoais e profissionais do escritor e acadêmico Peregrino Jr.
Contador de histórias, ensaísta, crítico, médico e professor, a temática central da sua ficção, em Puçanga, Matupá, A mata submersa e Histórias da Amazônia, é a visão do mundo amazônico, a imaginação do homem e a fatalidade geográfica que o conduz ao mistério dos mitos e à poesia das lendas.
Peregrino Júnior, filho de professor, foi um apaixonado professor universitário. Suas palavras, sobre o papel da universidade, ditas em 1940, quando andava eu pelo Jardim de Infância do Instituto de Educação, revelam pelo magistério um sentimento do qual sempre partilhei:
“A situação do ensino não permite a timidez hesitante do conformismo, nem as atitudes estéreis de negação ou de resistência passiva. Todos têm o dever de cooperar para que o ensino universitário entre nós melhore progressivamente nos seus quilates culturais, quer dizer, no sentido perpendicular da profundidade e da altura. Para isto poderemos contribuir decisivamente todos nós, professores, se nos lembrarmos de que o professor moderno deve exercer, no organismo universitário, aquela prodigiosa função hormonal de que nos falava Marañon. É exatamente esta a função mais importante do professor: a função estimuladora, que leva ao espírito do estudante os excitantes específicos do entusiasmo, da fé, da confiança e do interesse científico.”
Para Rachel de Queiroz, sua grande amiga desde 1939, quando veio morar no Rio, Peregrino, diferente do paroara nordestino, trouxe outra espécie de ouro da Amazônia: a descoberta da beleza da terra, do mistério do grande rio, que até então só se conhecia literariamente como “inferno verde”.
Embora no conto Buenolândia, de A Mata Submersa, Peregrino Júnior diga que: “à luz morna da noite tropical, minha infância voltou, sorriu-me, com um perdão unânime, para todos os meus erros e debilidades, e envolveu-me num abraço manso, sem palavras...”, e que era preciso conhecer a Amazônia, “estuprá-la, dominá-la violentamente para poder possuí-la com amor”, também declarou ter sido nela que “o menino mofino, rapaz frouxo, homem sem disposição para a luta”, reforçou “o caráter e endureceu a alma”. A Amazônia foi a sua “aventura do mundo – a aventura da liberdade e da solidão”.
Peregrino, como escritor, no plano das letras puras, teve esta direção singular.