Lobato é de todos


Arnaldo Niskier

A morte do escritor Monteiro Lobato, ocorrida em 4 julho de 1948, completou 70 anos em 2018. Com isso, desde o dia 1º de janeiro de 2019 toda a sua obra encontra-se em domínio público. Isso significa que a partir de agora os direitos autorais não são mais exclusivos dos herdeiros do autor, considerado por muitos como o pai da literatura infantil brasileira. A corrida das editoras deve ser grande para trazer novas edições focalizando os personagens históricos, como Dona Benta, Pedrinho, Narizinho, Emília, Tia Nastácia, Rabicó, Saci, Visconde e muitos outros.
 
Com certeza, as obras relacionados ao Sítio do Picapau Amarela vão merecer atenção especial dos editores, particularmente os títulos “Reinações de Narizinho”, “Emília no País da Gramática”, “Aritmética da Emília”, ‘Geografia de Dona Benta”, “História das Invenções”, “A Reforma da Natureza” e “A Chave do Tamanho”. Além dos clássicos “Narizinho arrebitado”, “O marquês de Rabicó” e “Jeca Tatuzinho”.
 
A importância das histórias criadas por Monteiro Lobato para a cultura brasileira é inquestionável. Mesmo assim, fatos isolados quase macularam a sua obra, como em 2010, numa atitude equivocada e incompreensível, o Conselho Nacional de Educação tentou impedir a venda do livro “Caçadas de Pedrinho”, a partir de denúncias de entidades ligadas a questões de racismo. O caso chegou a ser analisado no Supremo Tribunal Federal. O fato lembrou os tristes tempos do período em que imperou no Brasil a desprezível censura, de triste memória para todos.
 
Diante da polêmica criada em torno de alguns títulos do conjunto das obras literárias de Monteiro Lobato, a expectativa é que algumas editoras irão investir na modernização dos textos, atualizando e trazendo mais para o nosso tempo algumas histórias. Por outro lado, também deverá ocorrer reedição de certos livros com a manutenção dos textos integrais, para manter o sentido histórico. Lembramos que a adaptação de obras é permitida, mas sem mudanças no contexto da história original, ou seja: os personagens criados pelo autor devem ser mantidos. Caso contrário, se os herdeiros sentirem que houve alteração radical, a questão passa para a área judicial. 
 
Esse tema me atrai muito porque, nos anos 1970, quando participava da diretoria de Bloch Editores, formalizamos a compra dos direitos autorais dos personagens do Sítio e editamos diversos livros didáticos, com muito sucesso, como “Matemática da Emília”, “Sítio do Picapau Amarelo: Comunicação e expressão” e “Narizinho: Comunicação e Expressão”. Os livros faziam parte do programa de livro didático do governo e eram adquiridos em todo o país. 
 
Foi uma honra ter colaborado na formação de algumas gerações de alunos, com obras que utilizavam os personagens criados por Monteiro Lobato. Agora, com a novidade do domínio público dos títulos, penso seriamente em mergulhar no universo lobatiano. Com certeza, algumas adaptações poderão vir à tona, dando novas vidas para os personagens folclóricos e marcantes, com suas travessuras e tagarelices. É hora de trazer de volta as bonecas de pano, caçadores, contadores de história, caipiras e animais fantásticos.