O Preconceito contra o Ensino Técnico


Arnaldo Niskier

 

O gigante adormecido dá sinais de que está acordando para a realidade. Hoje, no Brasil, o preconceito contra o ensino técnico parece coisa do outro mundo, mas nem sempre foi assim. Quando Nilo Peçanha foi presidente da República (1906 – 1910), em decorrência da morte de Afonso Pena, elaborou um plano de educação técnica destinada “às crianças desvalidas”.
 
Pior foi em 1937, com a emenda constitucional que consagrou o Estado Novo de Getúlio Vargas. Um artigo, aparentemente impensável, afirmava que “o ensino tecnoprofissional seria destinado às classes menos favorecidas”. Isso naturalmente assustava os chefes de família. Quem gostaria, mesmo tendo origem humilde, de prestigiar uma educação discriminatória?
 
Provocado por uma pergunta do auditório da Columbia University, na semana passada, no seminário sobre a educação brasileira do futuro, promovido pela Casa do Brasil e o JB, tive que me alongar na resposta a uma pergunta que na essência era extremamente simples: “Ainda existe preconceito contra esse tipo de ensino, em nossa sociedade?”
 
Como responder com objetividade? Não temos mais que enfrentar o desafio dos números. Há cerca de 60 milhões de brasileiros frequentando nossas escolas, o que dá a proporção de 33% da população. O drama reside na qualidade dos serviços oferecidos, ainda abaixo da crítica, como comprovam os resultados de exames internacionais como o Pisa, em que figuramos nos últimos lugares, quando se trata de Matemática, Ciências e Leitura.
 
Há uma causa estrutural, que é a pouca importância dada à educação, em termos políticos, como comprova o investimento de apenas 4,5% do PIB. Outra razão, ainda mais concreta, é a situação de quase calamidade do quadro do magistério, às voltas com a tríplice questão da formação, da atualização e da remuneração dos nossos professores e especialistas.
 
Quando se enfrenta esse tipo de debate, numa prestigiosa universidade norte-americana, a primeira reação é pensar que não devemos proclamar lá fora os nossos obstáculos. Eram 100 pessoas no auditório, a maioria estudantes de pós-graduação. Depois vem o raciocínio objetivo: como deixar de dizer a verdade, se ela é tão cristalina?
 
Estufamos o peito para citar as perspectivas do pré-sal. Mesmo que seja uma riqueza para daqui a 10 anos (ou menos), é preciso promover uma verdadeira revolução nos métodos que estamos utilizando. A educação caminha num sentido oposto às perspectivas da nossa economia, como se estivéssemos à espera de um milagre improvável. Não temos os técnicos de nível intermediário necessários para atender à demanda da florescente indústria do petróleo e gás, sobretudo nos estados mais aquinhoados pela natureza, como é o caso do Rio de Janeiro. Não podemos nos conformar com o argumento de que, se faltarem brasileiros, importaremos técnicos de outros países. Não é uma ideia aceitável e vai contra a esperança de milhares de jovens que estão (ou deveriam estar) frequentando escolas de nível médio.