Um passarinho no céu


Arnaldo Niskier

Tive o privilégio de conhecer bem de perto o ex-ministro Jarbas Gonçalves Passarinho, nascido em Xapuri, no Acre, em 1920. De 1969 a 1972, foi um competente Ministro da Educação e Cultura. Costumava afirmar, bom orador que era, que devia a sua iniciação na área educacional ao meu livro sobre “Administração Escolar”, que fiz chegar à suas mãos pelo amigo comum, professor e general Antônio Figueiredo. A amizade consolidou-se e me lembro que, num jogo noturno, no estádio do Maracanã, em companhia do coronel Nilton Barreira, o ex-ministro confessou que se fosse presidente da República não titubearia em me nomear ministro da Educação... Faltaram-lhe algumas estrelas para que isso pudesse acontecer.
 
Passarinho, agora no céu, morreu em Brasília, aos 96 anos de idade. Coronel do Exército, na arma de Artilharia, foi um brilhante oficial, Senador da República por três vezes e governou o Estado do Pará. No MEC, deixou marcas profundas, como a criação em 1971 do Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral), entregue à genialidade de Mário Henrique Simonsen, meu colega de serviço militar na Marinha do Brasil. No seu período, foram alfabetizados mais de 5 milhões de brasileiros. E estabelecidas as bases da educação à distância.
 
A ele também se deve a criação (o que poucos sabem) da TV Educativa do Rio de Janeiro, Canal 2, depois do fechamento da TV Excelsior. A explosão do ensino superior (certo ou errado) aconteceu igualmente no seu período. Abriram-se muitas vagas em todos os cursos de 3 o grau.
 
Foi quatro vezes ministro de Estado: Trabalho, Educação e Cultura, Previdência e Justiça. Embora se afirme que ele foi um fiel servidor da Revolução de 31 de Março, dizia que a tortura não fora uma política do regime militar, mas deformação de alguns agentes.
 
Como escritor, produziu, a nosso pedido, o livro “Nosso Pará”, para Bloch Editores, com uma boa divulgação entre estudantes. Casado com D. Ruth, esteve presente num almoço oferecido por Adolpho Bloch aos integrantes do governo João Figueiredo. Sentado ao lado do então ministro da Aeronáutica, Brigadeiro Délio Jardim de Matos, comentou: “Veja, amigo, a coincidência: sou casado com uma Ruth, o senhor também, e o Arnaldo Niskier igualmente.” Todos riram com a minha conclusão: “Cada um de nós tem a Ruth que merece!”
 
Quando estava para inaugurar o Planetário da Gávea, em 1970, pedi ao então ministro da Educação que indicasse a data, pois o MEC havia doado o equipamento alemão Zeiss-Jena. Ele sugeriu o dia do aniversário do filho mais velho, 19 de novembro, e assim foi feito. Na ocasião, pedi ao diretor do Planetário que reproduzisse o céu de Xapuri, na data do nascimento de Jarbas Gonçalves Passarinho. Quando o locutor disse isso, ele pegou no meu braço, comovido, e disse no meu ouvido: “Você quer me matar do coração?” Concordo com o comentário do Ministro Marco Aurélio Mello, do STF, no dia do enterro em Brasília: “Foi um homem que teve uma passagem muito fértil na vida pública.”