Crônica: Nem bibliotecas, nem laboratório
Arnaldo Niskier
Há um movimento, em nosso país, no sentido de estimular as crianças, desde o pré-escolar, a gostar de leitura. Mais gosto do que hábito, pois este configuraria uma indesejável imposição.
Se os alunos se tornarem bons leitores, nas classes iniciais de alfabetização, cedo passarão a conviver com os livros, numa indispensável relação de cumplicidade. Quando isso acontece já na puberdade os resultados não são os mesmos. É claro que tudo depende das atitudes tomadas pelos professores do pré-escolar, aos quais se deve somar a contribuição necessária dos pais. Vimos em Tóquio, numa visita feita à capital japonesa, o quanto a presença dos pais nesse processo é fundamental. Em geral, antes de dormir, a criança japonesa pede a presença do pai ou da mãe ao seu lado, lendo algum livro, até que venha o sono.
Por isso é muito alto o índice de leitura do povo japonês. O gosto pela leitura é adquirido desde cedo e os meios oficiais, por intermédio de inúmeras bibliotecas, faz a sua parte, com uma abundante e diversificada oferta.
Pesquisas recentes (Censo Escolar de 2013) mostram que 65% das escolas brasileiras não têm uma biblioteca regularmente constituída e 44% delas não conhecem laboratórios ou computadores. Por aí se vê como é brutal o esforço para se alcançar a necessária qualidade do ensino, mesmo quando já existem, no sistema, benfeitorias como a nuvem de livros, que hoje alcança o número de 2,5 milhões de acessos, ao preço simbólico de 3,49 reais por semana.
No lançamento da quinta “Olimpíada do Saber”, nas instalações da Unisuam, em Bonsucesso, tivemos o ensejo de fazer algumas observações sobre o atual estágio do ensino médio em nosso país. Defendemos a adequada formação dos professores e a sua correta remuneração, o que infelizmente não está ocorrendo. Todos sabemos que é preciso investir, mas o que se ouve é a existência de sérias dificuldades para que isso ocorra. Devemos chegar a 6,1% do PIB, o que pode acontecer, mas o ideal seria que os recursos para educação fossem até 10% do Produto Interno Bruto. Como subir esses números se a divulgação denuncia que foram cortados 7 bilhões de reais dos recursos do MEC, numa brutal contenção?
Se isso acontece no plano federal, pior é o que está se passando em nível estadual, quando os reflexos podem ser mais claramente sentidos. Nossa precariedade, medida pelo comportamento dos alunos em leitura, matemática e ciências, deve sacrificar o proclamado crescimento econômico, com a particularidade de que meninos e meninas demonstram grande dose de nervosismo diante dos problemas que lhes são apresentados (os meninos menos do que as meninas).
De toda forma, manter os jovens nas salas de aula é um grande desafio. Existe uma evasão muito grande, notadamente nas regiões mais pobres do país. Além disso, segundo dados do Banco Interamericano de Desenvolvimento, registra-se um grande número de jovens que jamais frequentou a escola. Isso acontece, por exemplo, nas chamadas UPPS (Unidades de Polícia Pacificadora). Há 25 delas no Rio de Janeiro, onde ocorre o fenômeno, a merecer providências inadiáveis. A solução depende mais de vontade política do que de recursos financeiros. É grande o desafio de elevar a escolaridade média. Hoje, um em cada cinco jovens de 15 a 19 anos não estuda nem trabalha, conforme dados do IBGE.
Essa realidade induz os sistemas de ensino a um fenômeno comum, que é a distorção idade/série. A clientela escolar se atrasa no que deveriam ser as séries respectivas, ou seja, o ano de entrada é defasado. Em consequência, promove-se uma reação em cadeia e a criança termina o 9º ano do ensino fundamental não com ao previstos 15 anos, no máximo, mas com 18 ou 19, atrasando a frequência ao ensino médio, quando é possível acompanhar o curso com o chamado primeiro emprego. Esse fator é um dos indutores da desistência proclamada, uma das razões da perda de eficácia sobretudo da educação pública brasileira. Quem sabe, aí poderá estar uma das causas principais da violência assinalada em nossas escolas – e que tanto preocupa pais e professores?